terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Desque nasce começa a morrer

"Hum. Política é negócio de homem, podia dizer, se amunhecasse como tenho para mim que amunhecasse. Posso dizer que, se amofinasse e arreliasse como mulher parida, se estrebuchasse, podia fazer o que fizesse, eu até gostava. Me dá uma raiva por dentro, acho que careço ter raiva. Demais, não incomoda mais um ou mais outro, mais um ou mais outro eu vejo pelaí toda hora. A coisa que mais tem é morte, e o mais certo que tem. Desque nasce começa a morrer. Tárcio dizia: só faço os buracos, quem mata é Deus. Mesma coisa, até ele mesmo, Tárcio, chegando com as duas mãos enroladas na maçaneta da sela, cheio de buracos, nunca esqueço. Se morreu ele, morre qualquer. Então. A morte se apressase-se. É um alívio. Este válio de lágrimas, esta merda. Defunto é que nem praga de abobra, nesta terra. É um chão. Ih. Ê um chão. Chô, nem digo. Eu mesmo estou aí como uma vara em pé, posso qualquer hora desemborcar. Cheguei, como vai todo mundo, muito boa tarde, já voi indo, licença aqui. Quem se incomoda. Tudo só."

João Ubaldo Ribeiro
("Sargento Getúlio", Objetiva 2007, pg 39)