quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Curta-me!

"No círculo vicioso da inveja, a experiência efetiva é irrelevante; não é com tal ou tal outra vida e história concretas que se sonha: sonha-se ser o que os outros sonham. A inveja é, por assim dizer, uma emoção abstrata: o privilégio não precisa dar acesso a uma fruição especial da vida (sensual ou espiritual, tanto faz), ele só precisa suscitar inveja. Ou seja, privilégio não é o que faço ou o que acontece de extraordinário em minha vida, mas o olhar invejoso dos outros.(...)   O Facebook é o instrumento perfeito para um mundo em que a inveja é um regulador social. Nele, quase todos mentem, mas circula uma verdade de nossa cultura: o valor social de cada um se confunde com a inveja que ele consegue suscitar." 

 Contardo Calligaris
(em sua coluna na folha desta quinta-feira)

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

O rei na barriga de cada brasileiro

"O ministro Joaquim Barbosa tem sido tratado como um Drácula brasileiro por dizer o que pensa e sente. Poi, no Brasil, eis o meu primeiro palpite, somos todos treinados a dizer o que não pensamos. Seja porque seríamos presos por corrupção ou tomados como desmanchadores de prazer; seja porque faz parte de nossa persistente camada aristocrática não confrontar o outro com a tal "franqueza rude" a ser reprimida por sinalizar não o desrespeito, mas um igualitarismo a ser evitado justamente porque nivela e subverte hierarquias. Somos a sociedade da casa e da rua. Em casa, somos reacionários e sinceros; na rua viramos revolucionários e ninjas - a cara encoberta. Somos imperiais em casa, quando se trata das nossas filhas e fervorosos feministas em público, com as "meninas" dos outros. Observo que quando há hierarquia, não há debate nem discórdias; já o bate-boca é igualitário e nivelador. Por isso, ele é execrado entre nós, alérgicos a todas as igualdades. Discutir é igualar, de modo que as reações de Joaquim Barbosa assustam e surpreendem. Afinal, ele é um ministro. Como pode se permitir tamanha sinceridade? O superior não deveria discutir, mas ignorar e suprimir." 

 Roberto DaMatta
(Em sua coluna desta quarta-feira no Estadão)

domingo, 18 de agosto de 2013

Essa rapadura de país

"Diante dessa sarabanda agitada e da luta para não largar o osso, lembro-me de quando eu era menino em Itaparica, punha um pedaço de rapadura no chão e ficava esperando formigas brotarem do nada, várias espécies que só tinham em comum gostar de açúcar. Umas ruças, grandalhonas, eram minhas favoritas, porque ficavam frenéticas e não paravam um segundo, para lá e para cá, em cima da rapadura, apesar de que, volta e meia, uma parecia se saciar e caía imóvel - dura para trás, dir-se-ia. Eu não sabia, mas estava vendo o Brasil, só que as formigas não se saciam e quem cai para trás somos nós."

João Ubaldo Ribeiro
(Em sua coluna no Estadão deste domingo)

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

O mito da ciência

"Meu amigo, não existe conhecimento puro. É indiscutível a legitimidade da concepção eclesiástica da ciência, que se pode resumir nas palavras de Santo Agostinho: "Creio para que possa conhecer". A fé é o órgão do conhecimento, e o intelecto é secundário. A sua ciência incondicional não passa de um mito. Há sempre uma fé, um conceito do mundo, uma ideia, numa palavra: uma vontade, e cabe à razão explicá-la e comprová-la. Em todos os casos, chega-se ao 'Quod erat demonstrandum'. "

Thomas Mann
(Em "A Montanha Mágica", Herbert Caro (trad.), Círculo do livro 1952, pg 480)

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

O que diria Beckett para um representante da nossa classe política?

"Eis aí um grande homem, acusando as botas quando a culpa é dos seus pés."

Samuel Beckett
(Traduzido livremente de "Waiting for Godot", Ato 1)

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Pontos de vista morais

"Frequentemente, como diria Adam Smith, o que é visto como um vício privado pode tornar-se uma virtude pública."

Emrys Westacott
(Traduzido livremente de "The Virtues of our Vices", Princeton Press, 2012, pg 10)

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Linhas estreitas

"Se o idiota persistir em sua folia, tornar-se-á sábio."

William Blake
(Traduzido livremente de "The Marriage of Heaven and Hell", em "Works of William Blake", Kindle edition, Kindle location: 1551)