segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Mundus vult decipi... será?

"O interessante sempre é um pouco sinistro."

Thomas Mann
(Em "A Montanha Mágica", Herbert Caro (trad.), Círculo do livro 1952, pg 708)

domingo, 28 de outubro de 2012

Humor

"Se a gente já não sabe mais 
rir um do outro meu bem, 
então o que resta é chorar."

Los Hermanos
(Em "O Vento")

sábado, 27 de outubro de 2012

Expressão e conteúdo

"Deve-se expressar um mistério pelas palavras mais simples possíveis ou deixar de expressá-lo."

Thomas Mann
(Em "A Montanha Mágica", Herbert Caro (trad.), Círculo do livro 1952, pg 715)

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Qual máscara?

"A máscara que pesa e nos sufoca talvez não seja (no estilo 1960) a cara impassível que esconderia nossas emoções reprimidas. As máscaras que pesam e nos sufocam talvez sejam as que vestimos para expressar e teatralizar emoções excessivas e obrigatórias, que todos esperam de nós."


Contardo Calligaris
(Em sua coluna desta quinta-feira no Estadão)

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Cupins da ciência

"As ações das quais vocês devem se precaver consistem na supervalorização das pequenas, mesmo se corretas, descobertas; na negação infundada de tudo que lhes parece ter sido infundadamente afirmado; e no deixar-se interessar demasiadamente pelo progresso de algumas mentes científicas, mentes estas que na sua compreensão do universo não podem ser comparadas com maior precisão senão aos cupins no painel de um grande pintor: provam com gosto a madeira, com repugnância a cor e declaram que mesmo esta indesejável combinação é o resultado normal da ação de forças moleculares..."

John Ruskin
(Traduzido livremente de "Lectures on Art", Dodo Press, parágrafo 40, pg 25)

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

A bandeira da vida

"Os sábios da Idade Média afirmavam que o tempo era uma ilusão, que seu curso, entre causa e efeito, não passava do produto de um dispositivo dos nossos sentidos, e que o verdadeiro ser das coisas era um presente imutável. Terá passeado à beira-mar aquele doutor que foi o primeiro a conceber esse pensamento, saboreando nos seus lábios a leve amargura da eternidade? Seja como for, repetimos que aqui se falou de liberdades tais como a gente se permite nas férias, de fantasias inspiradas pelo ócio da vida, e das quais o espírito decente se farta tão depressa como um homem forte, do repouso na areia cálida. Criticar os meios e as formas do conhecimento humano, pôr em dúvida a sua validade objetiva, seria absurdo, desprezível e hostil, se tal atitude se baseasse numa outra intenção além da de designar à nossa razão limites que ela não pode transpor sem incorrer em negligência para com suas próprias funções. Devemos a nossa gratidão a um homem como o Sr. Settembrini, por ter tachado a metafísica de o "mal", ao instruir com a intransigência de um pedagogo o jovem cujo destino nos preocupa, e que ele mesmo, em certa ocasião, qualificara acertadamente de "filho enfermiço da vida". E a melhor maneira de honrarmos a memória de determinada pessoa a quem queremos muito é declarar que o sentido, o objetivo, o fim do princípio crítico não devem nem podem ser outros senão a ideia do dever e a lei da vida. Sim, a sabedoria do legislador, traçando criticamente os limites da razão, içou, nesses mesmos limites, a bandeira da vida e proclamou como um dever militar do homem servir sob essa bandeira."

Thomas Mann
(Em "A Montanha Mágica", Herbert Caro (trad.), Círculo do livro 1952, pg 661)

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

A amabilidade e a atrocidade

"Mas agora, do pé da minha coluna, abre-se uma vista nada má... Sonhei com a posição do homem e de sua comunidade polida, sisuda e respeitosa, a cujas costas se passava, no interior do templo, uma medonha ceia sangrenta. Será que os filhos do Sol se tratavam uns aos outros com tanta cortesia e amabilidade, precisamente na recordação silenciosa daquela atrocidade? Nesse caso tirariam uma conclusão muito sutil e elegante. (...) Vida ou morte, enfermidade ou saúde, alma e natureza - há oposição entre elas? Eu pergunto se constituem problema. Não! Não são problemas, e tampouco é o tal problema da sua distinção. A deserção da morte está encerrada na vida; sem ela não haveria vida, e a posição do Homo Dei acha-se no meio, entre a deserção e a razão, entre a coletividade mística e o individualismo inconsistente. É o que percebo da minha coluna. Nessa sua posição, cumpre-lhe viver de um modo fino e galante, e manter relações de amistoso respeito consigo próprio; pois só ele é distinto, e não as oposições. O homem é o dono das oposições que existem por seu intermédio, e por conseguinte ele é mais nobre do que elas. Mais nobre do que elas, mais nobre do que a morte, demasiado nobre para ela, e isso constitui a liberdade do seu cérebro. Mais nobre do que a vida, demasiado nobre para ele, e isso constitui a piedade do seu coração. Eis que acabo de fazer um poema, um devaneio poético sobre o homem. Quero lembrar-me dele. Quero ser bom. Não quero conceder à morte nenhum poder sobre os meus pensamentos! Nisso é que consiste a bondade e a filantropia, e em nada mais. A morte é uma grande potência. As pessoas tiram o chapéu e avançam a passo cadenciado, na ponta dos pés, quando ela está presente. Usa a cerimoniosa golilha do passado, e todos se vestem gravemente de preto em sua honra. Diante dela, a razão parece tola, porque é apenas virtude, ao passo que a morte é liberdade, deserção, amorfia e volúpia. A volúpia - clama o meu sonho -, não o amor! A morte e o amor, não, isso não rima; eles dão um poema insípido e falso! O amor enfrenta a morte; só ele, e não a razão, é mais forte do que ela. Só ele, e não a razão, inspira pensamentos bondoso. Também a forma não consta senão de amor e de bondade, a forma e a civilização de uma coletividade sensata e amável e de um belo Estado humano, na recordação silenciosa da ceia sangrenta. Ah, sim, isso se chama sonhar com clareza e 'reinar' bem!"

Thomas Mann
(Em "A Montanha Mágica", Herbert Caro (trad.), Círculo do livro 1952, pg 587-598)


terça-feira, 16 de outubro de 2012

Querer e não querer

"Donde vem este prodígio? Qual o motivo? Fazei que brilhe a vossa misericórdia, e eu pergunte, pois talvez me possam responder os castigos sombrios dos homens e as tenebrosíssimas desolações dos filhos de Adão. Donde provém este prodígio? Qual a causa? A alma manda ao corpo, e este imediatamente lhe obedece; a alma dá uma ordem a si mesma, e resiste! Ordena a alma à mão que se mova, e é tão grande a facilidade, que o mandato mal se distingue da execução. E a alma é a alma, e a mão é corpo! A alma ordena que a alma queira; e, sendo a mesma alma, não obedece. Donde nasce este prodígio? Qual a razão? Repito: a alma ordena que queira - porque se não quisesse não mandaria - e não executa o que lhe manda! Mas não quer totalmente. Portanto, também não ordena terminantemente. Manda na proporção do querer. Não se executa o que ela ordena enquanto ela não quiser, porque a vontade é que manda, pois, se a vontade fosse plena, não ordenaria que fosse vontade, porque já o era. Portanto, não é prodígio nenhum, em parte querer e em parte não querer, mas uma doença da alma. Com efeito esta, sobrecarregada pelo hábito, não se levanta totalmente, apesar de socorrida pela verdade. São, pois, duas as vontades. Porque uma delas não é completa, encerra o que falta à outra."

Agostinho de Hipona
(Em "Confissões", J. Oliveira Santos (tradutor), Vozes - edição de bolso - 2011, pg 180)

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Sonho de pai

"Pois eu sempre considerei que deve ser muito satisfatório a um pai de idade avançada ensinar aos seus filhos a gestão dos seus negócios e ter o poder, durante sua vida, de controlar suas condutas enquanto ao mesmo tempo dá a eles a instrução e os conselhos baseados na sua própria experiência. Ele deve ser muito feliz ao assistir a honra e a ordem na sua própria casa quando ela estiver nas mãos dos seus sucessores, e então salvaguardar as esperanças que ele pode ter formado sobre o futuro de seus filhos."

Michel de Montaigne
(Traduzido livremente do ensaio "On the affection of fathers for their children", em "Complete Essays", J. M. Cohen (trad.), Penguin Books, 1958, pg 145)


domingo, 14 de outubro de 2012

O belo inútil

"Ora, o útil é muito menos adorável que o belo. Uma ação bela é estável e permanente; ela produz uma gratificação constante àquele que a performa. Uma ação útil, por outro lado, facilmente desaparece e se perde; e a memória dela não é nem tão fresca nem tão agradável. Aquelas coisas que são mais caras a nós são as que nos custaram mais; e é mais difícil dar do que receber."

Michel de Montaigne
(Traduzido livremente do ensaio "On the affection of fathers for their children", em "Complete Essays", J. M. Cohen (trad.), Penguin Books, 1958, pg 137)

sábado, 13 de outubro de 2012

God Save the Queen

"Esta faixa é essencialmente o motivo pelo qual os Europeus e Sul-americanos não podem ser considerados confiáveis em se tratando de cultura pop. O vídeo possui mais de 500 milhões de acessos no YouTube, o mesmo número de re-tweetadas que o Justin Bieber obtém ao dizer "Bom dia" - e vem graças a Michel Teló, um músico brasileiro que pensa que está tudo OK quando introduz acordeões em sua música. Deixe-me dizer algo a você, Michel: acordeões não possuem lugar na música pop. É um instrumento antiquado que faz a música soar como um jingle de alguma rádio local Romena, e é exatamente a isto que "Ai Se Eu te Pego" se assemelha. É a faixa número 1 em quase todo lugar, exceto aqui e nos Estados Unidos, onde as pessoas são normais, pensam corretamente e não são capazes de falar português. Deus salve a Rainha e tudo mais."

Joe Bishop
(Traduzido livremente de sua coluna no "The Guardian", deste sábado)

domingo, 7 de outubro de 2012

Lição de epistemologia espiritual

"Os resultados da paixão são os únicos resultados confiáveis, isto é, as únicas conclusões convincentes. Felizmente neste nível a existência é mais gentil e mais leal do que assegura o sábio, pois ela não exclui ninguém, nem mesmo o mais insignificante dos homens, ela não engana ninguém: no mundo do espírito só é enganado aquele que engana a si mesmo."

Soren Kierkegaard
(Traduzido livremente de "Fear and Trembling", In: "Fear and Trembling and The Book on Adler", Alfred Knopf - Everyman's Library, 1994, pg 88)

sábado, 6 de outubro de 2012

Caprichosos

"A arte parece ser o único paraíso onde o capricho e as manias pessoais ainda são permitidos e mesmo valorizados."

E. H. Gombrich
(como citado por Richard Woodfield em entrevista ao Estadão)

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

A tarefa do artista

"A melhor coisa que a arte pode fazer é apresentar-nos a verdadeira imagem da presença de um ser humano nobre. Nunca ela fez mais do que isso, e não deveria jamais fazer menos."

John Ruskin
(Traduzido livremente de "Lectures on Art", Dodo Press, parágrafo 31, pg 21)

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A filosofia dos pobres de espírito

"Montaigne era um pai dedicado. Em um de seus mais célebres ensaios, ele discorreu sobre o afeto paterno, ostentando sua filha Léonor. Montaigne ostentou sua filha Léonor do mesmo jeito que eu ostentei meu filho Tito e Tom Cruise ostentou sua filha Suri. Léonor foi a Suri do Renascimento. Em outro de seus mais célebres ensaios, Montaigne argumentou que filosofar é aprender a morrer. Eu aprendi a morrer com a paternidade. Desde o dia em que Tito nasceu, fui totalmente anulado por ele. Perdi a vontade própria. Deixei de existir. Só um morto pode deixar de existir. Se filosofar é aprender a morrer, a paternidade é a filosofia do homem comum, a filosofia dos pobres de espírito, a filosofia das massas. É a única filosofia ao alcance de gente como eu e Tom Cruise."

Diogo Mainardi
(Em "A Queda", Record, 4ª ed, 2012, pg 106)

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

A importância de dar nome aos bois

"Quando se traz ao mundo da consciência ou da superfície algo oculto, conhecemos o seu lugar e assim podemos situá-lo. A classificação - o lugar das coisas - é o primeiro passo para tentar levar a coisa ao seu lugar, isto é, a um conjunto." 

 Roberto DaMatta
(em sua coluna do Estadão de hoje)