quarta-feira, 4 de abril de 2012

Não te cases!

"Nunca te cases, meu amigo; é o conselho que te dou. Não te cases antes que não possas dizer a ti mesmo que, na verdade, não há outra coisa a fazer, antes de não estares mais cego de tua paixão pela mulher de tua escolha, antes de ter visto bem claro o seu íntimo; sem isto, enganar-te-ás cruelmente e sem remissão... Do contrário, tudo quanto há em ti de nobre e de grande estará perdido... Enterrar-te-ás em frioleiras... Sim, inteiramente! Não me olhes com esse ar de espanto... Se há em ti alguma promessa de futuro, não tardarás em pôr luto por ela. Sentirás a cada instante que todas as portas estão fechadas para ti, exceto as dos salões onde valerás tanto quanto o primeiro imbecil, o primeiro cortesão que chega... Sim, é assim... - concluiu ele com um gesto bastante significativo.
(...)
Estás surpreendido por me ouvires falar desta maneira? Pois é, vês a tragédia de minha vida. Tu me citas Bonaparte, mas quando prosseguia ele, passo a passo, na direção de seu alvo, teu Bonaparte era livre, só pensava nesse alvo, em atingi-lo. Uma vez ligado a uma mulher, não passas de um forçado preso à sua corrente. Dize adeus à tua liberdade, às tuas aptidões, às tuas esperanças; curva-te sob o remorso de tê-las perdido para sempre. Os salões, os mexericos, os bailes, a vaidade, o nada mundano, tal é o círculo vicioso de que não posso mais sair. Eis que parto para a guerra, para a maior das guerras, e nada sei, não sirvo para nada. Sou muito amável e muito cáustico; também me ouvem com agrado em casa de Ana Pavlovna. Ah! essa sociedade tola, sem a qual minha mulher não pode passar, essas mulheres que... Se soubesses o que são no íntimo todas as mulheres distintas... e as outras! Meu pai tem razão. Egoísta, vaidosa, limitada, radicalmente nula, tal aparece a mulher, quando se mostra à luz verdadeira. No mundo causa ilusão, mas vista de perto, não é nada, nada, nada!... Não te cases, meu caro, não te cases - concluiu ele."

Leon Tolstoi
(Em "Guerra e Paz", tradução Oscar Mendes, Itatiaia 1997, pg 54-55)