"A verdade verdadeira só pode nascer por fé ou apoiada em critérios externos. Os meios de reprodução da vida seriam provas da verdade. Mas as coisas se complicaram porque tudo é possível por meio de montagens, de modo que se pode duvidar da prova fotográfica ou sônica. Um governador é filmado recebendo uma bolada; um sujeito é televisionado saindo com uma cesta de dólares de um elevador; uma senhora, esposa de um ilustre deputado, vai a um banco e é filmada pegando um dinheiro; ouvimos conversas fraternais entre um senador, um contraventor e seus associados; vemos fotos de um governador com um empresário com o qual se fizeram contratos de milhões. Em Júpiter e no Inferno, tudo isso seria um testemunho. Mas no Brasil do "tu é nosso e nós somo teu" - o velho Brasil do toma lá dá cá que transformou o governo numa casa-grande e a sociedade numa senzala -, isso é versão! A coisa mais inefável no Brasil de hoje é provar algo contra alguém que seja "nosso".
Temos fé ao contrário: acreditamos que a verdade não existe e que os fatos são fabricações. Pergunta-se: a bomba atômica e a goiabada cascão existem? O homem foi mesmo à Lua? Existe morte? Tivemos escravidão?
Falarei apenas sobre o homem na Lua. Sobre isso, ouvi do meu pai uma negação impetuosa: seria um truque dos americanos! Prova cabal: eles desceram na Lua e nela, conforme sabemos, não se desce, sobe-se. Ela está no céu, acima de todos nós!"
Roberto DaMatta
(Em sua coluna no estadão desta quarta-feira).