sábado, 9 de junho de 2012

O embalo de si mesmo

"Deve-se controlar a si mesmo, esta é a principal condição de todo gozo.  Não me parece que possa esperar obter tão cedo qualquer informação sobre aquela mulher que enche minha alma e pensamentos de tal maneira que mantem a todos eles vivos. Mas agora devo permanecer quieto, calmo, pois este estado no qual estou, esta obscura e indefinível mas intensa agitação, tem o seu lado doce. Sempre amei, em uma noite de luar, permanecer deitado em um barco sobre um dos nossos adoráveis lagos. Puxo os remos para dentro, removo o leme, estico-me inteiro no interior e olho para o vazio do céu. Quando o barco balança nas cristas das ondas, quando as nuvens correm sopradas por fortes ventos, de modo que a lua desaparece por momentos e então reaparece, então nesta inquietude encontro o descanso. O movimento das ondas embala-me, lapidando contra o barco uma monótona canção de ninar. O rápido voo das nuvens, a mudança entre a luz e a sombra inebriam-me, fazendo-me sonhar acordado. Assim também é agora, deixo-me estar, recolho os remos e o leme; com a saudosa e impaciente expectativa por me atirar em seus braços; expectativa que se torna cada vez mais e mais quieta, mais e mais cheia de felicidade, ela acaricia-me como a uma criança; o céu da esperança arqueia-se sobre mim; sua imagem flutua como a da lua, indistinta, cegando-me ora com sua luz, ora com sua sombra. Que agradável é rebater-se de um lado para outro em um lago tempestuoso - que agradável é permanecer agitado em si mesmo!"

Soren Kierkegaard
(Traduzido livremente de "Either/Or: A Fragment of Life", Alastair Hannay (trad.), Penguin Classics 2004, Kindle Location 4390)