sábado, 14 de maio de 2011

Liberdade do Espírito

"Por ser um espírito livre, Nietzsche sabia que a liberdade do espírito não é um conforto, mas uma grandeza que se quer e obtém, uma vez ou outra, com uma luta extenuante. Ele sabia que, quando se quer ficar acima da lei, se corre o grande risco de se achar abaixo dessa lei. Compreendeu por isso que o espírito só encontrava a sua verdadeira emancipação na aceitação de novos deveres. O essencial de sua descoberta consiste em dizer que, se a lei eterna não é a liberdade, a ausência de lei o é ainda menos. Se nada é verdadeiro, se o mundo não tem regras, nada é proibido: para proibir uma ação, é efetivamente preciso que haja um valor e um objetivo. Ao mesmo tempo, nada é permitido: são igualmente necessários um valor e um objetivo para escolher outra ação. O predomínio absoluto da lei não é a liberdade, mas também não é a disponibilidade absoluta. O próprio caos também é uma servidão. Só há liberdade em um mundo onde o que é possível e o que não o é se acham simultaneamente definidos. Sem lei, não há liberdade. Se o destino não for orientado por um valor superior, se o acaso é o rei, eis a marcha para as trevas, a terrível liberdade dos cegos."

Albert Camus
(Em "O Homem Revoltado", trad. , Valerie Rumjanek, Record 2010, pg 92)