sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Robespierre laranja

"Se a Revolução Francesa devesse se repetir eternamente, a historiografia francesa se mostraria menos orgulhosa de Robespierre. Mas como ela trata de algo que não voltará, os anos sangrentos não passam de palavras, teorias, discussões, são mais leves que uma pluma, já não provocam medo. Existe uma diferença infinita entre um Robespierre que aparece uma só vez na história e um Robespierre que voltaria eternamente para cortar a cabeça dos franceses. Digamos portanto que a idéia do eterno retorno designa uma perspectiva em que as coisas não parecem ser como nós as conhecemos: elas parecem para nós sem a circunstância atenuante de sua fugacidade. Com efeito, essa circunstância atenuante nos impede de pronunciar qualquer veredicto. Como condenar o que é efêmero? As nuvens alaranjadas do crepúsculo douram todas as coisas com o encanto da nostalgia; até mesmo a guilhotina."

Milan Kundera
("A Insustentável Leveza do Ser", Companhia de Bolso, 2008, pg 10)