quinta-feira, 16 de agosto de 2012

O valor do arrependimento

"É um sinal de uma infância bem-comportada quando a criança está disposta a pedir permissão sem perder-se em profundos questionamentos sobre se a ação está correta ou errada; e do mesmo modo é sinal de um homem magnânimo com uma alma profunda quando ele está disposto a arrepender-se sem maiores disputas. Sem o arrependimento a vida não é nada, não passa de fumaça na água. Sim, garanto-lhe que se minha própria vida, por alguma falta que não é minha, fosse tão carregada de tristezas e sofrimentos que eu pudesse nomear a mim mesmo como o maior dos heróis trágicos, bradar a minha dor, e apelar ao mundo chamando atenção a ela, minha escolha estaria assim feita; eu dispo-me desta vestimenta de herói e da paixão trágica, não sou o aflito que pode se orgulhar dos seus sofrimentos, sou o humilde que é consciente de seu pecado! Eu tenho somente uma expressão para aquilo que sofro - culpa; uma expressão para minha dor - arrependimento; uma esperança diante aos meus olhos - perdão; e se acho isto difícil, ah! Tenho apenas uma prece, jogarei-me ao chão e implorarei ao poder eterno que governa o mundo por uma graça, cedo ou tarde: que ele me permita arrepender-me. Pois conheço somente uma tristeza que pode levar-me ao desespero e carregar tudo mais comigo - a tristeza diante a possibilidade de que meu arrependimento seja uma ilusão, uma ilusão não em relação ao perdão que ele busca, mas em relação à responsabilidade que ele pressupõe."

Soren Kierkegaard
(Traduzido livremente de "Either/Or: A Fragment of Life", Alastair Hannay (trad.), Penguin Classics 2004, Kindle Location 9050 - Cap. 2 volume II)